PELEJA

 

Finalmente era chegado

O momento da peleja

Que do povo agoniado

Calaria toda queixa

Porém, se o Mago falhasse

E o tal do bando escapasse

Só lhe daria tristeza.

 

Em cordel não há medida

Pra falar o que se deve

Se é verdade ou é mentira

Mais vale como se escreve:

E assim lutou o Maguinho

Que mesmo estando sozinho

Calou o Bando dos Sete! 

 

A PELEJA COM SERRA GRANDE

(A BALEADEIRA INVOCADA)

 

Sabendo que era um gigante

Difícil de se abater

Primeiro foi Serra Grande

Quem achou de aparecer

pensando, feito um jumento,

Que tamanho é documento

Na hora do “vamo ver”.

 

Quando olhou para o Maguinho

Do outro lado da estrada

Seu rosto abriu um sorriso

Pensando que era piada

E pra ferir o coitado

Achou que bancar o brabo

Naquele instante bastava:

 

“— Sou mais forte que Golias

Tu num pode me vencer

Maguinho “fí” de uma égua

Se prepare pra morrer

Pois tu não passa dum cisco

E pra se bater comigo

Devia ao menos crescer!”

 

Sem sair de onde estava

O Maguinho respostou:

“— Eu sou da ponta virada

Virado no "estopô"

Amigo de Virgulino

Devoto de Pade Ciço

Com força, fé e fervor”

 

“— Não venha com seu discurso

Que aqui não é palanque

Acerte logo seu prumo

Pois meu nome é Serra Grande

Comigo é que o laço aperta

A cobra pia, o cão berra

E o rico morre de fome!

 

Minha fama é conhecida:

Se mexer comigo até

Urubu cospe carniça

E pobre enjeita filé

Não sobra nem a carcaça

E o cabra bebe cachaça

Pensando que é café...”

 

Sou cabra que mata a fome,

Com urtiga em vez de pão 

Não tenho medo da morte

De gente ou bicho-papão

O Cão pode ter “dez chifre”

Mas eu faço dele um bife

Na ponta do meu facão!”

 

“— Serra Grande, não se espalhe!

Escute o que vou dizer

Pois toda essa pabulagem

Agora eu vou desfazer

Atente na profecia:

Se Davi matou Golias

Eu hei de matar você.” 

 

Dito isso abaixou-se

Pegou um seixo no chão

Lisinho feito uma uva

Redondo feito um limão

Botou na baleadeira

Fez uma mira certeira

E disparou o rojão

 

O tiro saiu zunindo

Feito bala de canhão

Raspou o vão duma casa

Da sala até o oitão

Torou em dois um facheiro

E uma pedra no meio

Rasgou que nem papelão

 

Pegou na testa suada

Do gigante que, na hora,

Mijou-se todo nas “calça”

Com a lapada venenosa

Dobrou por cima dos joelhos

Depois esfregou o queixo

Por onde se esfrega a cobra

 

Ali ficou estirado

Depois de muito ciscar

Com um olho arregalado

Que nem deu tempo fechar

E pra completar o feito

O Mago, no seu direito

Com jeito foi provocar:

 

“— Abaixo de Deus, o resto;

Acima de Deus, ninguém!

Pois que venha o bando inteiro

Pra eu mandar pro além

Do jeito desse bandido

Que achava que era sabido

Mas viu que eu era também!”

 

A PELEJA COM CURURU

(O FUNIL QUE DESENCHE)

 

Resolvido Serra Grande

Era a vez de outro safado

Cururu, sapo danado,

Que foi logo ignorante

E disse: “— deixe comigo

Que esse Mago vadio

Daqui não segue adiante!”

 

Sem mais ninguém entre os dois

Correram pra se enfrentar

E o que aconteceu depois

É certo, vai espantar

Até quem muito já viu

De assombração já fugiu

Ou gosta de engambelar:

 

O Maguinho, disparado,

Correu, mas não descuidou

Já o Sapo, atrapalhado

Num galho seco topou

Caiu por cima da banha

E numa queda medonha

Inteiro se esparramou!

 

Virou de perna pra riba

Deu sete voltas no ar

E quando veio de cima

Não pôde mais levantar

Ficou ali estirado

Dizendo: “— cabra safado,

Tu fez eu escorregar!”

 

O Mago vendo naquilo

Uma grande ocasião

Lembrou-se de outra arma

Passada por Lampião:

O tal funil que “desenche”

Mais um sagrado presente

Que logo botou na mão

 

Chegou pela retaguarda

Do malvado carniceiro

Pegou pelo cós da calça

Abaixou até o joelho

Virou o cabra na marra

E como um tição em brasa

Meteu-lhe o funil no rego

 

A dor foi tão desgramada

Que o cabra ficou zarolho

E já não sentia nada

Do pé até o pescoço

Apenas olhou pro Mago

E disse: “— cabra safado,

Me arrebentasse o ferrolho!”

 

O funil, feito uma tromba,

Mais longa que um trabuco

Meteu-se com tanta sanha

Nas entranhas do xibungo

Que quase lhe arranca a alma

De tanto que lhe varava

Igual um poço sem fundo

 

Cururu secou ligeiro

Ficando ali estendido

Sem um pingo de recheio

Pior que um saco vazio

Tão triste foi o negócio

Que até as “bola dos óio”

Rolaram no meio-fio.

 

E assim foi que o vilão

Encontrou sua desgraça

Ficando somente a casca

Por cima da armação

Mais esticado que um pau

Mais seco que bacalhau

Esparramado no chão!

 

A PELEJA COM “NOVE DEDO”

(O CHOCALHO DO BOI GREGO)

 

Muito cheio de soberba

Nove dedo foi chegando

Vermelho igual a bandeira

Que trazia como manto

Tamanha era sua raiva

Ao ver que o Mago matava

Um a um, todo seu bando

 

Nessa hora, novamente

Padre Ciço e Lampião

Surgiram na sua frente

Por meio de uma visão

Querendo lhe aconselhar

Pro Mago poder passar

Por mais essa provação

 

E assim, se revezando

Cada um na sua fala

A ele foram contando

Toda a sorte de desgraça

Que sempre que teve vez

O comunismo já fez

Por todo canto que passa:

 

“— Comunista fala muito

Porém, não sabe escutar

Por isso parece surdo

Mas basta lhe cutucar

Naquilo que ele não gosta

Pra lhe deixar sem resposta

Sem ter como se safar

 

Por isso tome o chocalho

Do boi que perdeu a musa

E use nessa disputa 

Pra não ser atraiçoado

Pois esse som é bravio

E todo cabra vadio

Se perde nesse badalo!”

 

E o leitor não se espante

Se eu disser que se passou

Com o triste meliante

Justamente o que falou

Padre Ciço e Lampião

Depois da grande lição

Que o nosso herói escutou.

 

E provou que aprendeu

Pois logo que balançou

O chocalho, já notou

Que o barbudo estremeceu

Botando pra reclamar

Que não queria escutar

O badalar que se deu

 

Pois a cada badalada

Do chocalho abençoado

O bandido se “alembrava”

Do mal que tinha causado

E ouvia dentro da mente

A voz de cada inocente

Por ele desencarnado.

 

O fim desse condenado

Foi o mesmo de quem passa

A vida inteira pecando

Plantando só a desgraça

Até que chega uma hora

Que quando a justiça cobra

Quem deve, sempre lhe paga!

 

E o peso da culpa é tanto,

Pelo mal que foi causado

Que os joelhos vão dobrando

Até que o pobre coitado

(Que achava que Deus não via

E não lhe castigaria...)

Vê logo que estava errado!

 

Assim foi com Nove Dedo,

Que achava, muito iludido,

Que nunca ia ser punido

Pelo mal que tinha feito

Mas, agora acuado,

Perdido e agoniado

Sentia dentro do peito

 

Uma culpa tão pesada

Que implorava por perdão

Diante daquelas almas

Que surgiam em procissão

Trazidas pelo chamado

Daquele santo chocalho

Que o Mago tinha na mão

 

Por isso, nessa agonia

Querendo acabar com aquilo

O bandido arrependido

Sem ver mais outra saída

Só teve uma solução:

Pegou do próprio facão

E fez do ouvido bainha!

 

Deu seu último suspiro

Pedindo perdão a Deus

Negando que era ateu

Pra não enfrentar castigo

Do jeito que sempre é

Comuna, que só tem fé 

Na hora em que está perdido!

 

Quando tudo terminou

O Maguinho foi guardar

A arma que lhe ajudou

Novamente a triunfar

Mas inda faltava chão

Pro fecho dessa missão

Poder, enfim, alcançar!

 

A PELEJA COM MARIANÃO

(O CHICOTE DE TRIUNFO)

 

Marianão foi chegando

Com a zanga dum tufão

Ao Mago só desejando

Levar de vez pro caixão

Depois de descer a faca

Naquilo que mais faltava

Pra sua transformação...

 

Só que o Mago já sabia

Que quem tinha essa ambição

No mundo só aprendia

Se tivesse uma lição:

Que era levar chibata

Comprida e muito bem dada

Até perder a noção!

 

Por isso, com o chicote

Que o careta tinha dado

Foi logo botando abaixo

Pra mostrar como era forte

Três véia raparigueira

Um bando de cangaieira

E dez “machinho” de coque

 

Aquela coisa parida

De cobra com jacaré

Sequer arredou o pé

Pois era muito atrevida

Mas esse foi, justamente,

O erro que, brevemente,

A vida lhe custaria...

 

O Mago veio de um lado

A bruxa veio de outro

E o povo virava o rosto

Pra não ver o resultado

Do chicote folião

Batendo contra o facão

Que tantos tinha capado!

 

Quem ia ficar por cima?

Qual seria o resultado?

A arma cortante e fria 

Ou o chicote abençoado?

Não tinha como dizer

E quando se foi saber

Quem viu ficou engasgado!

 

Pois no fim da confusão

Que a poeira se assentou

Somente um corpo ficou

Largado naquele chão

E como não era o Mago

Foi logo o povo tomado

Por grande satisfação!

 

Nem um doido apostaria

Que daria o que se deu

Mas nessa briga esquisita

O aço foi que perdeu

Trazendo fama ao chicote

E junto com ela a morte

De quem lhe desmereceu:

 

A bandida mais safada

Que o sertão já conheceu

Agora estava acabada

Por obra e graça de Deus

A quem muito cabra macho

Por ela ter se lascado

Sorriu e agradeceu

 

Essa noite no inferno

Até quenga deu de graça

Com Marianão se achando

A rainha da cocada

(mas deixe, que Lampião

Já tinha dito pro Cão

Assar seu lombo na brasa!...)

 

A PELEJA COM DIABO COXO

(O GIBÃO DESVIADOR)

 

Era a vez de Diabo Coxo

Mostrar sua serventia

Vingando toda quadrilha

Que morria pouco a pouco

E mal desceu do cavalo

Já foi direto pro Mago

Jogando seus “desaforo”

 

O Maguinho nem ligava

Não tinha tempo a perder

Sabia que era bravata

Nem valia responder

Melhor ouvir seus padrinhos

Soprando no seu ouvido

Que logo iria vencer

 

Pois tava tudo na mão

Não tinha por que arregar

Só devia confiar

E botar logo o gibão

Pra`quela alma sebosa

Tomar o rumo da cova

Por bem de todo sertão

 

Diabo Coxo era lento

Com a presa amarrada

Pois isso lhe dava tempo

De fazer quanta desgraça

Quisesse sem se entreter

Somente pelo prazer

De ver o mal que causava

 

Mas se a briga era arrochada

Virada na correria

Conforme sempre fazia

Metia o dedo na arma

Gritando desesperado

E atirando pro lado

Que a sua venta virava

 

E esse foi o seu plano:

Sem dizer nem a que vinha

Botou o Mago na mira

E foi logo disparando

Sentou o dedo sem pena

Porém, no meio da cena,

Notou que estava falhando...

 

Disparou uns doze tiros

De pistola e espingarda

Mas não fez nem um chapisco

No Mago, que só levava

O tranco, mas não caía

E quem olhava dizia

Que o bicho comia bala!

 

Mas a prenda encantada

Que ganhou de seus padrinhos

É que muito funcionava

Não deixando nem um tiro

Triscar no couro do Mago

Que assim estava fechado

Guardado e bem protegido!

 

Já o traste do aleijado

Não podia acreditar

Que estava todo encarnado

Sem nem o Mago atirar

Pois cada tiro voltava

E quando lhe acertava

Fazia logo sangrar!

 

E o herói, sem fazer troça,

Uma bala atrás da outra

Foi tomando, mas a roupa

Mandava tudo de volta

Pra todo povo assistir

E ver o vilão sair

Dali direto pra cova!

 

Diabo Coxo, caiu duro

tremendo e perdendo a cor

E quando ficou escuro

E nada mais enxergou

Vazando por doze bicas

O que restava da vida

Ao Mago ainda falou:

 

“— Maguinho, cabra safado

Tu não vale um tostão!

Se tivessem me contado

Que tu tinha esse gibão

Não tinha me afobado

Podia ter escapado

Pra não morrer como um cão!

 

No final pediu a bênção

A seu mestre, Satanás

Que todo bandido trás

Por santo de devoção

E finalmente morreu

Se afogando no breu

Da sua própria ambição...

 

Do jeito que Padre Ciço

Tinha dito aconteceu;

Assim como Virgulino,

Que também lhe prometeu:

Pro Mago deu tudo certo

Enquanto mais um perverso

Para o inferno desceu! 

 

A PELEJA COM SUSANO PAPO MANSO

(O PIÃO DE SUCUPIRA)

 

Como era falador

Metido a filosofeiro

Papo Manso foi ligeiro

Querendo ser o doutor

Porém sua falação

Naquela situação

De nada lhe adiantou:

 

“— Bom negócio fez o Diabo

(Assim disse, muito esperto)

Pois sabia que o errado

Nesse mundo ia dar certo

E veja como acertou!

Pois hoje quem tem valor

É quem não vale um tareco!”

 

Dito isso, o Maguinho

Logo veio a responder

Já sabendo o caminho

Que devia escolher

Pra`quele traste escutar,

Mas sem se deixar levar,

Desanimar ou correr:

 

“— Nisso eu até concordo

Com vossa filosofia

Mas esse nunca foi modo

De gente ganhar a vida

Somente fazendo o mal

Achando que é o tal

Tramando na covardia

 

E quem desse jeito pensa

Vai ver que pensou errado

Pois quando chegar o dia

Em que for sentenciado

A morte vai se mostrar

E quando o cabra notar

Já foi do mundo riscado!”

 

Papo Manso foi ligeiro

Contra o Mago lutador

Espalhando aquele cheiro

De quem nunca se banhou

Mexendo sempre na barba

Que era a grande morada

Dos bichos que lá cevou

 

Mas isso pouco contava

Que o Mago tinha o pião

Que como um raio girava

Valente como um tufão

Tivesse um desse em Angico

É certo que Virgulino

Não tinha tombado em vão! 

 

Começara a peleja

Do Mago com o falador

Que, como sempre, mandou

A bicharada ligeira

Pra cima do nosso herói

Mas sendo o Mago veloz

Tratou de não dar bobeira:

 

Agarrou logo o pião

Entalhado em sucupira

E mesmo sem fazer mira

Botando efeito na mão

Puxou de vez a ponteira

Fazendo tanta poeira

Que até cobriu a visão!

 

O bicho saiu zunindo

Parecia uma cigarra

Correndo dentro da praça

Que nem um redemoinho

Deixando quase sem fala

O povo que se espantava 

Diante do seu zumbido

 

O pião, sem descansar,

Criou um muro de vento

Que ligeiro foi crescendo

Parando os bichos no ar

De jeito que a ninhada

Foi sendo toda cercada

Sem ter por onde escapar

 

Até mesmo Bonifácio

Encolheu as suas asas

E meteu-se numa casa

Com medo de ser levado

Porque o vento era tanto

Que até avião passando

Podia ser derrubado!

 

Papo Manso apavorou-se

Tremendo que só chocalho

Igual a quem perde a pose

Depois de cantar de galo

E quando pensa em correr

É só porque não quer ver

O quanto já está lascado!

 

Mas bandido nunca nega

Sua eterna covardia:

Na hora do pau, arrega

Na hora da peia, chia

Provoca, mas não encara

Nem honra o que tem na calça

Pior que quenga vadia! 

 

Foi assim com o tal Susano

Na hora da confusão:

Queria sair voando,

Mas quando veio o tufão

De vento trazendo bicho

No meio do rebuliço

Não teve mais salvação!

 

Levado no mesmo bolo

Perdido e sem direção

Ciscou de um lado pro outro

Querendo voltar pro chão

Mais foi girando no ar

Até o vento parar

O só restar o pião...

 

Criador e criaturas

Sumiram sem deixar rastro

Porém, nem tudo foi culpa

Do pião abençoado

Pois teve gente que viu

No meio do rodopio

O fim do cabra safado:

 

Tomado de agonia

Gritando de desespero

Sem rumo nem paradeiro

Cercado por suas crias,

Que enquanto rodopiavam

Inteiro lhe devoravam,

paravam e depois morriam.

 

Quem trabalha com afinco

Sabe bem o que é lutar

E o prazer de descansar 

Depois do dever cumprido

Por isso, tendo o pião

Cumprido sua missão

Tirava agora um cochilo...

 

O Maguinho recolheu

Essa peça valiosa

De que, nessa dura prova

De coragem, se valeu

Fazendo sumir do mundo

Mas um meliante imundo

Que teve o que mereceu!

 

A PELEJA COM WALDISGLEYSON

(O BACAMARTE DE PRINCESA)

 

O sangueiro inda corria

Levando ladeira abaixo

Num rio todo encarnado

O bando que se perdia

Porém sabia o Maguinho

Que seu maior desafio

Agora é que enfrentaria!

 

Pois sendo o mais trapaceiro

Desgraçado e desumano

Foi somente Waldisgleyson

No fim, que acabou sobrando

Sentindo que essa era a hora

De dar um fim nessa história  

Vingando todo seu bando

 

Mas justo quando pensava

Ser a sua perdição

De uma velha oração 

Que diziam que ensinava

Lampião para o seu bando

O Mago foi se “alembrando” 

Enquanto se preparava: 

 

“— Que Jesus não me abandone

Na hora da precisão

Fazendo valer seu nome

Sobre toda a criação

Porque não importa as “arma”

Só vale mesmo é o cabra

Que sabe honrar os culhão!

 

Tem hora numa batalha

Que só Deus pode ajudar

Com sua divina graça

Quem dele não duvidar

Por isso, que ele me acuda 

E nessa hora mais dura

Não deixe de me guardar!”

 

Tomado assim de coragem

Avançou contra o bandido

Que ficou tão ofendido

Diante da valentia

A ponto de provocar:

“— Se eu hoje não lhe matar

Não vou ganhar o meu dia!”

 

Até o povo escondido

Saiu pra testemunhar

O que, se tivessem dito,

Ninguém ia acreditar:

Que pela mão do Maguinho

Aquele infame bandido

Não tinha como escapar!

 

Pois o Mago se mexia

Mais liso do que sabão

Ligeiro que nem ladrão

Dobrado feito uma enguia!

E como fazia isso

Daquele jeito ladino

Nem ele mesmo sabia!

 

O Mago descia o braço

Sem dó e sem piedade

E quanto mais lhe batia

Descia com mais vontade

De se fazer orgulhoso

E ser das graças do povo

Merecedor de verdade!

 

Mas quase morre na praia

Quando o sujo malfeitor 

Se aproveitou de uma falha

Que o Maguinho descuidou

Meteu a mão numa arma

E quase matou a bala

O cabra que lhe arretou!

 

O povo ficou irado

Com tamanha covardia

E todo mundo dizia

Que aquilo estava errado

Porém, naquele momento

O que terminaram vendo

Até parecia um causo:

 

O chefe dos malfeitores

Atirou sem piedade

Querendo tomar as dores

Daquele bando selvagem

Que o Mago tinha mandado

Pro colo quente do Diabo

Pagar por tanta maldade

 

Mas o Mago bem sabia

Se valer das qualidades

Que quem é da Paraíba

Já tinha desde que nasce:

E dando um rabo-de-arraia

Venceu a primeira bala

Que nem se fosse miragem! 

 

E assim foi desviando

Saltando de bala em bala

Que o cabra ia disparando

enquanto ele se entortava

Dum jeito que parecia

Que inteiro se desfazia

Mas só que não desmanchava!

 

E logo se retorcia

Descia, depois pulava

Corria e rodopiava

Voltava donde saia

e quando a bala chegava

Fazia que se abaixava

Rodava e depois subia

 

O corpo era de borracha

As “junta” feita de mola

Não tinha frente nem costa

Pois tudo se confundia

E o Mago assim escapava

Enquanto o tiro cantava

E o cabra não desistia!

 

Porém, da última bala

Não teve como escapar

Pois foi direto na caixa

“Dos peito”, que quis achar

Zunindo feito um pião

Pertinho do coração

Um canto pra se encostar!

 

Sem arrimo, condição

Ou alguma serventia

O povo a tudo assistia

“Cum” queixo “em riba” da mão

“Pru mó” dele num cair

Achando que esse era o fim

Do Bruce Lee do Sertão!

 

Por isso causou espanto

Que o Mago, sem se assustar

O peito foi "cavucando"

Até a bala encontrar

E lhe atirar numa vala

Enquanto o bandido olhava

Sem jeito de acreditar!

 

O bandido que assombrava

Juntamente com seu bando

Agora é quem tinha a cara

Tomada pelo espanto

E só não chorou na hora

Porque um homem só chora

Na hora em que tá casando!

 

Sabia que esse inimigo

Não tinha como falhar

Pois era bem protegido

E veio pra devorar

O bando dos sete inteiro

Com fome de justiceiro

Pra nem o rastro deixar!

 

E como quem já ouvia

O bandido se entregar

O Mago pegou a arma

Que ainda faltava usar:

O bacamarte afamado

Que quem já tinha enfrentado

Jamais viveu pra contar!

 

E assim varou com tudo

O peito do cramunhão

Usando os sete cartuchos

Que eram pr`essa missão

Fazendo cada balaço

Deixar o chefe varado

Se estrebuchando no chão

 

Vencido pelo cansaço

Humilhado e sem abrigo

Sabendo que seu reinado

De terror tinha perdido

Notou, enfim, Waldisgleyson

Que só existe um direito

Pro cabra quando é bandido:

 

Ganhar um laço na goela

Ou o fio dum facão

Que sem esticar conversa

O Mago trouxe na mão

Pra dar um fim na peleja

Cortando sua cabeça

Diante da multidão!

 

E como nada valia

Esse bruto malfeitor

O povo comemorou

Por sete noites e dias:

Um pra cada desgraçado

Do bando, por ter tomado

No canto que merecia!

 

DESFECHO

 

Do jeito que me contaram

Assim mesmo lhes contei

De como foi conquistada

Em uma terra sem lei

Há muito tempo perdida

A paz que tanto queria

Poder gozar outra vez.

 

Depois do feito bendito

O Maguinho retornou

Pra terra onde se criou

E cuidou desde menino

Mas não sem agradecer

Ao povo e por ele ser

Nas ruas engrandecido.

 

Podia ter se tornado

Delegado, promotor

Prefeito, vereador

Senador ou deputado  

E se quisesse ser santo

Foi dito no Vaticano

Que o Papa tinha assinado!

 

Lhe deram casa e comida

Diploma sem estudar

Medalha e bolsa família

Pra viver sem trabalhar

Até as quengas vieram

E os fazendeiros trouxeram

As filhas pra ele casar

 

Podia ter se tornado

Enfim, um cabra famoso

Com gado gordo no pasto

“Mil-réis” até o pescoço

Mas sendo um cabra pacato

Montou em seu bode alado

E despediu-se do povo

 

O tempo foi prosseguindo,

Passando bem devagar

Até o Maguinho achar

A dona do seu destino:

Uma moça valorosa

Esposa e mãe amorosa

Com quem esquentar seu ninho:

 

Chamavam Maria Rosa

Essa moça educada

Que pra ser tão amorosa

De berço já foi criada

E todos naquela terra

Diziam não ter donzela

Mais bela e delicada!

 

Bonifácio "avoador"

Devolveu as suas asas

Ao anjo que lhe emprestou

E também levou as armas

Que nunca ninguém mais viu

Depois que ele partiu 

Pra sua santa morada...

 

Quanto ao santo padroeiro

Do povo mais sofredor

E ao famoso cangaceiro

Que ajudaram o protetor,

Cada um foi pro seu lado

E nunca mais se cruzaram

Depois do que se passou...

 

O Mago seguiu a vida

Cuidando da criação

Plantando do que podia

Pra manter as “provisão”

Honrando sua família

Que todo ano crescia

Com grande satisfação!

 

Não foi pra ganhar manchete

Que a vida arriscou

Por isso matou os Sete

Mas nunca se pabulou

E sim pra salvar o Norte

Que, mesmo encarando a morte,

Dos inimigos livrou.

 

Um dia morreu tranquilo

Deixando filhos e netos

Herói, porém esquecido

Igual ao bando perverso

Que nunca foi derrotado

Até ser desafiado

Por esse cabra correto!

 

Por isso, sem aumentar

Tão pouco diminuir

Contando só o que ouvi

(Pois nada quis inventar...)

Pro povo não se esquecer

Não ia poder viver

Sem essa história contar:

 

De um Mago considerado

Que cumpriu com seu papel

E pra ser recompensado

Além de um lugar no Céu

Depois de tanto fazer 

Não tinha como não ser 

Lembrado neste cordel!

 

 

FIM